Iluminação pública

Até outubro de 1903, data do início do fornecimento regular de energia elétrica à vila de Espinho, a iluminação foi, juntamente com a água, saneamento e policiamento, um dos problemas graves com que a freguesia se debatia. A praia só recebia iluminação a petróleo durante os meses de Verão e, muitas vezes, somente a partir do mês de agosto, prolongando-se, o mais tardar, até finais de outubro. As restantes estações do ano não eram contempladas, prejudicando a população residente e obrigando as famílias que gostariam de passar o inverno nas suas casas de Verão a terem de se retirar da praia. Para saírem à rua durante a noite os habitantes tinham que se munir de uma lanterna, única maneira de se poderem desviar de qualquer poça de água ou lama, ou mesmo de um transeunte que seguisse em direção oposta para não ser abalroado. A imprensa todos os anos reclamava com as autoridades concelhias pelo número insignificante de candeeiros que eram colocados na via pública e também pela demora no seu funcionamento. Na época balnear de 1889 as pretensões foram satisfeitas com um reforço de mais sessenta pontos de luz, no entanto, o correspondente do jornal "O Comércio do Porto", pegando em exemplos de anos anteriores, alertava para a necessidade de se acenderem os candeeiros, porque muitas vezes acontecia que os mesmos existiam, mas não eram acesos ou, quando isso ocorria, a iluminação era muito má.

De acordo com Fausto Neves em "Espinho Há 50 Anos”, a primeira casa iluminada a luz elétrica foi o Café Chinês. Em 1889 o proprietário Carlos Evaristo comprou um motor e instalou-o no seu café-casino. O Teatro Aliança, inaugurado no ano seguinte, também usufruiu do mesmo sistema de iluminação e no ano de 1894, a Assembleia Recreativa já funcionou com luz elétrica. A quarta máquina geradora de corrente elétrica apareceu em Espinho, no ano de 1897, fornecida pela casa Biel do Porto, destinada à iluminação do Hotel Bragança e de certas casas particulares situadas nas suas imediações, entre a Av. Serpa Pinto (Av. 8) e a rua Bandeira Coelho (19). 


Todos os anos organizavam-se comissões para promover a iluminação elétrica durante o Verão, as quais lançavam subscrições públicas. No ano de 1900 estava instituída a empresa de Luz Elétrica de Espinho, que por carta enviada à Câmara, participava que o espanhol D. Pedro Gazapo, societário da referida empresa, cedia ao município durante a época balnear em curso o rendimento que lhe devia pertencer do aluguer da máquina geradora de luz. Um dos grandes impulsionadores desta iniciativa foi o proprietário João Baptista de Carvalho que, à sua conta, custeou a instalação da rede de luz elétrica na rua Bandeira Coelho, a nascente da linha férrea. Entre os principais subscritores estavam a Companhia Real dos Caminhos de Ferro e a fábrica de conservas Brandão Gomes & C.ª.

Os habitantes e os veraneantes, animados nos meses de Verão pela iluminação elétrica tão cintilante pela viveza dos focos, já não podiam com a luz frouxa do petróleo, tão mortiça e bruxuleante que incutia a impressão de desolada existência. Na opinião do jornal "Gazeta de Espinho”, durante o inverno a povoação recolhia-se a uma espécie de isolamento da civilização que contrastava com os ares cortesãos da temporada balnear. Uma das formas de combater esta adversidade era desenvolver e beneficiar a praia com iluminação elétrica permanente e essa devia ser a preocupação dos dirigentes locais.         

A resolução do problema da iluminação pública foi uma prioridade da segunda vereação do novo concelho. Em abril de 1902, a administração municipal liderada pelo presidente Joaquim Pinto Coelho lançou as condições do concurso para o fornecimento exclusivo da iluminação pública do concelho de Espinho. A edilidade concedia um contrato a qualquer indivíduo, sociedade ou empresa por um período determinado. O concurso era extensivo à eletricidade ou a qualquer sistema aperfeiçoado de gás iluminante. Na mesma altura, procedeu-se ao cálculo da quantidade e qualidade dos aparelhos de gás iluminante que existiam no concelho. Para esse efeito, o administrador publicou um edital no qual determinava um prazo de doze dias para os residentes que possuíssem aparelhos declararem sobre a qualidade do gás utilizado e os locais da sua instalação. As condições do concurso determinavam que no fim do prazo da concessão ficaria a pertencer ao município todo o material, segundo uma avaliação prévia efetuada por peritos nomeados. 

O regulamento previa que o horário da iluminação pública e particular fosse regulado pela Câmara, sendo que para a luz pública seria diariamente elaborado e requisitado pelo concessionário, enquanto para a luz particular o horário seria estipulado de modo que a iluminação estivesse pronta a funcionar vinte minutos antes do ocaso do sol e só terminasse vinte minutos depois dele nascer. Competia ainda à entidade exploradora reforçar a iluminação por luz intensiva pela forma e nos locais que a edilidade indicasse, num período compreendido entre os meses de julho a novembro.

A concessão foi atribuída por concurso público a uma empresa espanhola, a "Casa de Vigo”, dirigida pelo engenheiro Júlio Domenech, residente em Pontevedra, e por Emílio Ruiz del Portal, engenheiro eletricista e residente em Vigo, cedendo o município um terreno para a instalação da central elétrica entre as ruas do Norte (4) e Primeiro de Dezembro (29). O projeto foi aprovado pela Inspeção Geral dos Telégrafos e Indústrias Elétricas  e o contrato efetuado por um prazo de dez anos, obrigando-se o concessionário a depositar na Caixa Geral de Depósitos a quantia de 500$000 réis para garantia da sua execução. 


O contrato de concessão foi publicado no "Diário do Governo", n.º 239, de 24 de outubro de 1903, e a "Casa de Vigo" montava gratuitamente as instalações sempre que as subscrições da luz fossem por período superior a seis meses, enquanto concedia vantagens no pagamento das lâmpadas para todo o ano.

Das condições de iluminação constavam 160 lâmpadas de dezasseis velas, distribuídas por todo o concelho, das quais 140 ficariam acesas desde o pôr do sol até às duas horas da madrugada e as outras 20 até ao nascer do sol, e ainda doze arcos voltaicos em séries de quatro arcos de oito amperes durante os quatro meses, como aliás já previa o caderno das condições de concurso de 1902. O preço da iluminação pública importava em 2.000$000 réis anuais, pagos pela Câmara Municipal, em prestações mensais de 166$660 réis. O município comprometia-se a não cobrar aos concessionários, durante os dez anos do contrato, qualquer imposto.



Em junho de 1904 foi feita a escritura da nova sociedade anónima de responsabilidade limitada denominada Companhia Geral de Eletricidade, sediada em Espinho, com o capital social de 30.000$000 réis, dividido em trezentas ações de cem mil réis ao portador, na primeira série, e de 40.000$00 reis divididos em quatrocentas ações, na segunda série. 
A sociedade podia, sempre que quisesse, e de acordo com o artigo 9.º dos estatutos, aumentar o seu capital através da emissão de novas ações e obrigações ao portador ou realizando empréstimos. A empresa tinha por fim a exploração da eletricidade e a fundação ou aquisição de centrais elétricas em Espanha e Portugal. Como se pode observar no quadro a maioria dos acionistas residiam em Vilagarcía de Arousa, província de Pontevedra. 


As ações não correspondem na sua totalidade ao número lançado nas duas primeiras séries (400), mas sim aos registos que conseguimos obter para um período que vai desde 1904 até 1914 (data da última assembleia geral de acionistas) e durante o qual foram realizadas alterações de capital com compra e venda de títulos.

A primeira direção foi constituída por Júlio Domenech Montaner, presidente, Segundo Perez Labadia, vice-presidente, João Labadia Ruiz, secretário, Serafim Reboredo Blanco e José Ramon Lorenzo, vogais. A suspensão da energia elétrica às duas horas da manhã provocava grandes incómodos à população, facto que levou a Câmara, em 1907, a negociar com a Companhia a produção de luz elétrica durante toda a noite, melhorando dessa forma as condições de iluminação pública, o que representava considerável melhoramento. 

Um ano antes do término do contrato, a direção da Companhia Geral de Eletricidade submeteu à aprovação da Administração Geral dos Correios e Telégrafos um projeto para reforma da instalação elétrica, redes de distribuição e edifício da referida Companhia. Deste projeto fazia parte a compra de um terreno, entre as ruas 23 e 30, destinado à construção da nova fábrica geradora que já estava a ser construída em outubro de 1912 e onde mais tarde se instalaram os Serviços Municipalizados de Eletricidade. No dia 21 de outubro de 1913 terminou o contrato celebrado entre as duas entidades e, por força do artigo 23.º, ficava a pertencer à Câmara Municipal todo o material respeitante à iluminação pública, bem como o edifício, mediante prévia avaliação de peritos. Para este fim foi estabelecido entre as duas partes um convénio no qual a Câmara se comprometia a pagar até ao dia 30 de março de 1914 a importância resultante da avaliação de todos os bens, e também a liquidar no prazo de vinte dias a conta corrente que tinha com a Companhia. A partir daqui o regime de iluminação foi municipalizado, no entanto, manteve-se em serviço até ao fim do prazo de liquidação do contrato a mesma direção técnica. A constituição de um novo regulamento de iluminação e a organização do quadro de pessoal foram os objetivos seguintes para a manutenção da boa ordem dos serviços.